sábado, 17 de julho de 2010

No controle



‘Hoje o sol tem cor de gelo’ foi o que pensou a moça ao acordar. Vestiu-se com pressa, meias brancas e um “All Star” surrado.
O vento era delicado lá fora, as nuvens de algodão. Alguns trocados no bolso, um ônibus verde e, então, seu destino.
Trabalhar em Las Vegas nunca foi um sonho, mas era logo ali e havia meninas legais.
Por entre as mesas, imitava um riso qualquer e, como de praxe, balbuciava as monossilábicas palavras, sentia-se orgulhosa por saber fingir.
Havia um perfeito enquadramento dos fatos aos seus íntimos planos, exceto as roupas e o salário. Mas era bem inteligente e isso bastava.
- entre! – exclamou a risonha colega no banco traseiro de um fusca.
- Não, obrigada. – respondeu ela, apressada, nada risonha, concentrada num ônibus verde, parado na esquina.
Tudo sob controle, salvo uma antipatia nada proposital, que fazia martelar na mente da garota, a indesejada inexpressividade devoradora.
 ‘Agora o sol derreteu’ analisando outra vez o astro, que já se escondia no fim da tarde.
Após a comida diária, uma breve leitura, algumas lembranças e o cochilo no sofá. E então mariana concluía outra vez a tarefa de todos os dias.
Era tudo absolutamente normal e prazeroso. O silêncio infinito das paredes, cortinas azuis e abajur de noites a fio. Regia os minutos, exceto a solidão implacável configurada em cada gota de sal que rugia no escuro.

Michelle Portugal

sábado, 3 de julho de 2010

Das sobras


Hoje eu me vi perdida
respirando a poeira das sobras
e estive cansada
fui escombros e pó, mais nada
 .
Hoje, cingida num saco
a dor me foi o único abrigo
e então fui só vestígio
e fui vertigens e fui lágrimas...
 .
hoje, olhando o abismo
inerte e seduzida
eu vi sombras e fui sobras;
fui só o inverso da vida.
 .
(Michelle Portugal -26/06/2010)

sexta-feira, 2 de julho de 2010

Breve relato sobre você

Foi assim

a lua se perdeu no céu

e ele, negro,

te fitou indiferente


e então

uma dor estranha

marcou a esperança

a tua esperança já tão marcada


e uma lágrima tímida

traduziu a voz amarga

de uma alma sofrida


era a tua alma

era a tua alma reduzida

a dor


eu?

de longe fitei a tua sina

e olhei-te, indiferente

era a mesma indiferença

a dura e então indiferença

daquele negro céu


Michelle Portugal – 11/06/2010